quinta-feira, 18 de março de 2010

entrou em casa e quase pisou numa esperança que já estava esmagada ali a dois passos da entrada.
verde vivo em migalhas arrastado no chão como se fosse cinza, como se nem fosse.
já estava acostumada a essa cena, se emocionou sem nem sentir, desviou e foi pro quarto.
a cama estava arrumada, colcha de riscos roxos, vermelhos, amarelos e ocre, ela adorava. caiu por cima com cara e peito...
uma vez falaram que ela cantava como se tivesse um pássaro morto na garganta. ela achou aquilo muito horrível, mesmo não entendendo muito bem o que isso queria dizer. e agora só cantava baixinho, antes de dormir. canções que libertassem o passarinho morto, que lhe dessem uma morte tranquila. ela inventava tudo na hora: mãe mãe olha a gota caindo da folha vamo esperar ela cair deita comigo no edredom quentinho, me faz carinho enquanto a gente olha ela cair.
o ritmo inexato com pausas longas e o tom livre. o pássaro saia devagaríssimo. ela tinha paciência. só tinha que livrar aquela inexistência de si.
dormiu algumas horas e acordou com sede. foi à cozinha beber um pouco de água. ao passar pela porta da sala, viu que tinham varrido a esperança. bebeu a água. sentiu que ia vomitar. abriu a janela da cozinha e voou.

Nenhum comentário: